terça-feira, setembro 28

Dezanove


São longas as estradas por onde te vou levar. Não têm janelas nem sentidos proibidos. Juntos, traçamos as bermas onde nos deitamos em tufos de erva. O bastante para sentir a circulação de um sangue de guloseima. Sabemos os nossos instintos como magnetismos. Sabemo-nos animais em cio transparente. Sei a tua pele como esse traço contínuo que insisto num dogma. Sabes os meus olhos semicerrados, imaginando-te suada. Os nossos cabelos vigiam o vento. As mãos, sugerem-se descobertas. O dia será continuado de noite.

quarta-feira, setembro 22

Profundamente


Conheço o domínio que tens em mente. Existem portões pesados, pintados de negro, onde se encerram as dúvidas inaladas por esses desvios. Conheço as perspectivas de tais emoções, cortar-me fundo nas tuas arestas. Divido-te ao meio procurando apetites ocultos. Duvido conseguir evitar tais perigos. Talvez por me sentir em perigo sem eles. talvez por acreditar. Certeza de quem se alimenta do proibido.

terça-feira, setembro 21

Sem fôlego


Seduzido por esse crime, acompanho-te no exacto estado em que a fome significa todo um jogo, decidido em regras que se escrevem ao longo da imprevisibilidade. Desconheço os teus hábeis gestos. Não consigo entender as estratégias. Ou o lugar onde me estenderás. Sei apenas o que fazer com a espuma do capuccino. Traçar-te uma circunferência e mergulhar, ignorando geometrias.

segunda-feira, setembro 20

Agora


Dá-me o tempo que decidiste consumir. Entrega-me esses minutos e deixa-me criar horas de pétalas. Oferece-me o tempo da tua nudez. Uma que seja crua e vazia de cor. Consente os gestos e deixa-me prostrado, ritual incoerente onde serás o altar de um desvario encenado. No teatro do meu capricho, o esmero é ímpeto e tem o teu nome.

domingo, setembro 19

Nesse pressentimento


Existes em agudos neste piano. E por muito que sussurres, são as notas soltas na extremidade das teclas brancas que te dão a silhueta. Podes assumir o pelo sedoso de um felino passo a passo, aquele arminho onde afago a tua presença. Podes manter uma imobilidade de museu. A que me fará inquietar por dulcíssima e inacessível. Podes desaparecer. E ao perpetuares, estarei deitado sobre o piano, como se o amor fosse uma oitava.

sábado, setembro 18

Amanhã


Quando te repreender será a contraluz. Quero ver-te no recorte do teu incómodo, entre o teatro e te despires por vontade. Quando te vir acatada e suada, quando respirares o meu atrevimento, os meus olhos responderão a trela que me ofereces. E nos teus olhos, surgirão todas as imagens que a obscuridade te poderá oferecer. Como tu és oferenda. Como eu me ofereço.

sexta-feira, setembro 17

Ainda


Cedo aos passos juvenis da tua presença. E assim, apenas na razão de uma brisa estival, desmorono-me sob o ensaio que me retira o sorriso tímido. Procuro os mil significados do verbo sucumbir, com as certezas de um professor subjugado pela aluna. Rodo de olhos fechados, julgando-me só. Precipito-me rolando o fio de cabelo molhado que te cai sobre os olhos, restos de Verão com sabor a baunilha. Encostado à parede, procuro o teu cheiro. Apetece-me o irresistível, na medida única de tudo, recusando as partes desse todo. E aos porquês, respondo ainda.

quinta-feira, setembro 16

Primeiro


Invejo-te. Sigo com os olhos essa maneira de seres resultado de pincel. Percorro o caminho onde deixaste os passos de dança, onde volteias o romance desses ombros procurando carícia, uma de longe, de tanto, de toda uma tarde de sentidos perigando a pausa. Ordeno-me as lágrimas de te saber, das horas que te julguei impossível, dessa doutrina onde te lia inexistente. E subo as estrelas, rompo os dias de calma, desfaleço catedrais, desmaio-me em mármores terrenos ao te julgar real, a métrica da tua existência, o rumor soprado de mulher parietando-me o sono. Atinjo-me mortal nessa cadeia onde me agrides o íntimo. E deixo-me à inveja, no desgosto dessa posse que não tenho. No desejo mudo de te escrever singular.